quarta-feira, 9 de novembro de 2011

nota explicativa, ou, momentos de "barato"

Não vou me ater muito a tantos detalhes, porque em uma nota explicativa geralmente a pessoa interessada só lê porque sabe do que se trata o assunto principal do texto a que se refere. Por isso, a escolha do título dessa postagem não é a toa (nunca é, mas enfim).

Pra quem acompanha minha novela, já sabe da minha história com o cushing...

Nos últimos dias, várias pessoas que não sabiam da minha "condição" acabaram sabendo das minhas aventuras de saúde por meio de uma forma um pouco sensacionalista, pelas redes sociais. Meus pais davam boletins médicos a todo instante e em meio a zilhões de mensagens de "melhoras, Rafa" mais zilhões de perguntas "o que aconteceu!?" surgiram.  
Resolvi tornar um pouco mais claro e também contar minhas peripécias, porque eu adoro uma fofoca. 
Há quem acredite que ficar dando detalhes da vida pessoal na internet pra todo mundo ver não é legal e etc, eu também acredito, mas ah... como eu fiz uma cirurgia no cérebro vamos jogar a culpa nisso, digamos que fiquei meio louca momentaneamente e vou sair falando (quase) tudo. 

Ok, chega de enrolação e vamos para as partes "sórdidas"... 

Acabou a graduação, começaram as aulas do mestrado, aquela coisa toda,  a discussão sobre o cushing tava meio de lado, mas a dosagem do remédio sempre aumentando e nada de o cortisol baixar... Fui em novas consultas, mais discussões sobre novos procedimentos, outras intervenções  e eis que surge o assunto radiocirurgia. Infeliz, ou felizmente, o convênio do plano de saúde não autorizou esse procedimento alegando coisas como "mas você nunca disse que tinha essa doença quando fez o plano, não podemos cobrir"  
Oi? Eu preciso saber das doenças que eu tenho ou vou ter ao longo dos anos pra poder ter plano de saúde? 
É, foi mais uma novela, tivemos (minha super mãe, logicamente) que ir atrás de advogados, ler direitos, fazer documentos e o escambal... e então  nesse ínterim o médico achou melhor mudar a opção e que eu devesse fazer uma nova intervenção cirúrgica (do mesmo naipe da que fiz ano passado em SP) e foi o que eu fiz. 
Passadas todas as problemáticas com o plano de saúde, finalmente autorizaram.

Primeiro tive que passar numa consulta com anestesista... na sala de espera o diálogo: 
moça aleatória: "oi, é pré-operatório também? o meu é pedra."
minha mãe: "a dela é o cérebro."
cri cri cri cri....
Segundos depois entra um médico falando com a recepcionista:
"ah, tô atrasado, que horas são minhas consultas? qual o consultório hoje?"
recepcionista: não, doutor, você não tem consulta hoje, ainda não liberei sua agenda, pode voltar pra casa"
Apavorei! O anestesista não sabia que dia era e nem onde ele tava! E agora? Quando chegou minha vez, perguntei para a doutora que me consultou se seria ela na minha cirurgia, ela disse que não, mas que o médico que apareceu ali também não consultava mais e que eu podia ficar tranquila. Ufa!

Fui internada no dia 31 de outubro (uuuuuuuuuuhhh!)
A cirurgia foi no dia 1 de novembro, uma terça-feira. Me deram um remedinho pra dormir, fui pra sala de cirurgia vendo flores, coisa mais linda, não lembro de nada. 
Foi aquela coisa, retirada transesfenoidal (= pelo nariz) do adenoma (= tumor) hipofisário (= no cérebro) . Depois fui para a UTI, meio grogue logicamente, meus pais me visitaram por alguns segundos e  voltaram mais tarde. 
Passei a noite na UTI, sem comparação com SP,  o simples fato de saber que eu não estava longe de casa me confortava infinitamente. Mas isso não foi o suficiente. 
O ar condicionado tinha que estar altíssimo e eu, que estava com dois tubos no nariz fazendo pressão até o cérebro, tinha que sentir vontade de espirrar e.... tchanam! Espirrei! 
Imaginem duas rolhas impedindo uma cachoeira de sair do seu cérebro e fazendo ele flutuar e bater nas paredes de seu crânio! Gritei, gritei, gritei... as enfermeiras saíram correndo fecharam as portas do quarto da UTI, que eu estava, e injetaram uma senhora seringa de morfina diretamente na minha veia, fiquei em estado de êxtase, parei completamente olhando pro nada, foi um "barato" só. 
Depois disso aparentemente tudo ok, saí da UTI e  fui para o quarto. O cirurgião passou lá para tirar os tubos e foi aquela euforia... sentei na poltrona e ele disse "preparada?" e eu "vamos lá!" (bem macha!) 
Da maneira que estava inchado meu nariz,  eu imaginava que o tubo ia só até a metade do nariz, mas quando ele começou a puxar (sem anestesia e sem piedade) o negócio não parava mais de sair! Eu, de olho fechado, meus pais e meus irmãos  de plateia olhando aterrorizados aquele cano gigante saindo... tremi. E ainda tinha a outra narina. Mas lá fomos nós e aquele objeto saiu. O médico foi embora, voltei pra cama, familiares foram embora, fica apenas minha mãe de acompanhante durante a noite.... eis que meu nariz começa a escorrer feito torneira e a dor na minha cabeça fica insuportável e sinto como se meu cérebro dançasse dentro da minha cabeça novamente! Dor insuportável, enfermeiras ligam pros médicos, de uma em uma hora me aplicando morfina e o cirurgião informa: amanhã você vai novamente para a cirurgia. 
Eu já sabia  dos riscos da cirurgia (já tinham me falado ano passado), o nome do que ocorreu foi "fístula".  A cola (um pedaço de gordura da minha barriga misturada com uma cola especial pro meu cérebro) da abertura que fizeram no cérebro, em consequência do meu espirro, caiu... e, por isso, o liquor do cérebro estava escorrendo e a pressão disparou e meu cérebro ficou flutuando. Essa fístula é extremamente perigosa porque é uma oportunidade pra tudo que é tipo de doença perigosa (meningite e afins), então, a urgência pra fechar era grande. 
Fui novamente para cirurgia para fechar a fístula. Na manhã seguinte, dessa vez bem acordadinha e sem ver flores, aliás, no caminho para o centro cirúrgico, uma maca com um corpo recém passado dessa pra melhor passou pela minha  frente... 
Deixando a parte mórbida de lado, a nova cirurgia foi toda ok, fui entubada novamente, anestesia geral e tudo o mais... mas dessa vez fiquei com uma sonda em apenas uma narina, no final da sonda (dentro da minha cabeça, na abertura onde estava a cola) tinha um balão para comprimir a cola e não deixar abrir novamente.
 Voltei para o quarto, sem ir para a UTI.  A recuperação foi completamente diferente da vez de SP, lá eu parecia que nem tinha feito cirurgia. Aqui, eu realmente parecia (tô parecendo, né) uma pessoa doente. Recebi massagem nos pés do papai, cuidados 24h da mamãe, visita de irmão mais novo pra ver procedimentos de terror e até irmão do meio foi dormir no hospital comigo.
Os médicos me visitaram todos os dias no quarto, e pareceram dessa vez bastante otimistas. Disseram que conseguiram visualizar o tumor, conseguiram retirar e agora precisamos ver as reações clínicas e rezar para que tudo ocorra como esperado. 
Por mais que eu queira que seja como um episódio do House e acorde no outro dia linda e maravilhosa e curada, os resultados são lentos. 
Fiquei 4 dias com a sonda no nariz e o otorrino (colírio para meus olhos, diga-se de passagem) tirou o balãozinho de mim disse que iria falar com a minha endocrinologista (mais um anjo na minha vida que passou noites sem dormir preocupada comigo!) e eu estava liberada! Agora só estou com o nariz assado de tanto assuar, mas faz parte...
Depois de descrever todas essas "coisas maravilhosas"... eis que faço minha reflexão. Faltei algumas aulas de metodologia de pesquisa, então não vou aplicar teoria nenhuma às minhas observações e vou apenas "falar ao vento"...


Sempre que acontece alguma coisa na nossa vida a gente pensa "o que eu fiz pra merecer isso?" 
Eu pensei nisso novamente essa semana... 
Eu não faço a minima ideia do que eu fiz pra merecer tudo isso...
... tanto cuidado, tantas visitas, tantas mensagens positivas, tanta coisa boa num momento aleatório na vida das outras pessoas. 
O mundo não para quando nós passamos por problemas, mas perceber que as pessoas se importam e significam muito pra gente é uma coisa sem explicações. 
Assim como alguns se perguntam porque acontecem desgraças eu me pergunto "por que acontecem tantas coisas lindas na nossa vida?"
Recebi visitas de amigos que não via há anos, recebi visitas (mais de uma vez) de amigos que vejo sempre, recebi mensagens, recebi energias boas... 

Acho que o grande mistério da humanidade é porque nós passamos a vida buscando explicações. Só acho que o que vale a pena é buscar explicações pras coisas boas que acontecem e perceber que são beeeeeeeeeeeem grandes.
Aquela história do pontinho colorido que se sobressai no meio de um pano branco é bem verdade. O que demora pra gente perceber é que o pontinho colorido é que dá a dimensão pras coisas em volta e nós é que temos que dar o valor certo a elas.
Ok, já comecei a filosofar e falar muito abstratamente, então chega. 
Enfim... em breve (ou não) escreverei mais de outros momentos de "barato", porque agora já tô precisando sair da frente do computador antes que fique uma poça de ranho no meu teclado.


p.s. percebe-se que não fiz nenhuma revisão no texto, né? mas, por favor, deem-me um descontinho... (vou ficar usando essa desculpa um tempão! hahaha)

oração da graduação


Eis que demorei alguns meses para reescrever aqui. 
Na verdade  tenho tantos rascunhos que mereciam ser postados, mas  não tenho coragem de publicá-los (porque são realmente RASCUNHOS) 
Acho apenas que esse post merece ser publicado, está longe de ser algo completo e explicativo e eu deveria escrever coisas maravilhosas sobre esse momento, mas como deixei criar mofo ficou um pouquinho difícil de organizar.. então acho que vou apenas ao ponto que interessa: o discurso.
Sim, o discurso de formatura
Agora sou Licenciada em Letras Língua - Portuguesa e Literaturas Vernáculas, pela Universidade Federal de Santa Catarina, coisa chique! 
Lógico que eu não parei por aí e já passei no mestrado em Educação e agora sou "mestranda", mas aí já foge do foco do post...
Continuando... eu fui oradora da turma, junto com um colega. Estávamos numa super correria para finalizar trabalhos, fazendo provas e tudo o mais e ainda a "briga pelo discurso". Precisávamos de um texto pronto num prazo ínfimo daqueles que todos os universitários conhecem... e como eu sou eu, acabei puxando a responsabilidade pra mim e fiz o texto todo (claro que mandei pro meu colega pra ele dar suas sugestões, mas a sugestão dele foi: É ISSO AÍ!)
Então como o tempo urgia e nós precisávamos nos posicionar, deu no que deu...
Eu não quis escrever palavras muito emocionantes porque se eu começasse a ler e gaguejasse e borrasse minha maquiagem eu ia achar um desastre, então as palavras vieram pra representar o que nós (formandos - mais a nossa "patotinha" que entendeu, mas ok) queríamos dizer, sem muita choradeira... 
(mesmo porque choradeira a nossa professora paraninfa linda e maravilhosa já conseguiu fazer sem muitos esforços no discurso dela direcionado a nós, ainda citando nomes!)
Claro que eu tinha que colocar um "toque de Rafaella", ou melhor, de "Alice", mas tudo se encaixou.  Enfim.... lá vai:


Discurso de Formatura

ELE: Boa noite, primeiramente gostaríamos de desejar glória a todos os formandos...

EU: Glória? Mas o que você quer dizer com glória?

ELE: Eu quero dizer que esse é um dia especial para todos nós, porque finalmente acabamos a graduação.

EU: Mas glória não significa isso...

ELE: Como diria Humpty Dumpty, uma palavra significa exatamente o que eu quero que ela signifique.

EU: Como diria Alice, a questão é saber se você pode fazer uma palavra significar para você coisas diferentes do que significam para outras pessoas...

ELE: Continuando com Humpty Dumpty, a questão é... saber quem é que manda...

EU: Bom... É inevitável pensar em inúmeras citações para descrever o processo pedagógico (ou talvez não tão pedagógico assim) do curso de graduação.
Inicialmente nos fazem acreditar que nossa palavra não vale nada sem que esteja baseada em alguma teoria que a sustente, mas também há quem diga que isso é só provocação.
O ambiente acadêmico é um local onde se aprende a citar, a reconhecer os nossos discursos nos discursos do outro. É nesse reconhecimento de discursos que vamos nos constituindo, encontrando concepções que vão nos orientar (ou desorientar) em nossa vida acadêmica.

ELE: Agradecemos a todos que fizeram parte de todo esse processo (muitas vezes no estilo kafkiano!), aos que nos influenciaram em nossa busca pelo conhecimento, aos que nos apoiaram em todos os momentos, aos que apenas diziam que nos apoiavam e aos que não nos apoiaram em momento algum, desde os que nos disseram “você tem certeza que quer continuar?” até aos que nos disseram “vamos lá, precisamos revolucionar!” .

EU: Não foram poucas as lutas contra o tempo e os momentos em que gostaríamos de seguir o coelho branco e ir para o país das maravilhas... Apesar de tirarem nosso direito da “hora do chá” e as lanchonetes virarem salas de aula, ninguém cortou nossas cabeças... 
[Sim, isso foi uma sutil alfinetada, e nessa parte eu tava tão nervosa que errei a concordância e li "ninguém CORTARAM nossas cabeças". Vi jeito de pessoas gritando que iam cortar minha cabeça porque eu, uma FORMANDA DE PORTUGUÊS, errou a concordância! hahahaha]
Estamos aqui porque soubemos aproveitar as influências positivas e as negativas serviram de desafio para que fossemos muito melhor.

ELE: Hoje receberemos títulos diferenciados, de Bacharel e/ou Licenciatura, mas na essência isso não nos diferencia no exercício de nossas futuras profissões.
Afinal, trabalharemos com a palavra, somos profissionais da Linguagem. Quem trabalha com a Linguagem sempre estará compromissado com a interação entre as pessoas e o conhecimento.
Passamos por tanto e quando chegamos ao final da graduação nos vem à mente a pergunta da lagarta: “Quem és tu?” e não sabemos como responder...
Somos todos pesquisadores E professores, pois estamos sempre em busca de novos saberes e seja ministrando aulas, seja escrevendo artigos, seja fazendo traduções, produzimos conhecimento!

EU: Somos fruto das interações, feitos de infinitos “eu(s)”, somos um tecido de citações.
Entramos na Universidade sem saber quem exatamente éramos, terminamos a graduação e... continuamos sem saber! Mas... Como Alice respondeu para a lagarta: “eu sei quem eu ERA hoje pela manhã, mas já mudei muitas vezes desde então...” 
é esse, portanto, nosso objetivo: continuar mudando muitas vezes.
A graduação acabou, mas ainda temos muito pela frente...

Feliz desaniversário a todos nós!!


E essa foi minha oração final na graduação.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

o que te move?

Vou começar falando de dificuldades... afinal das contas, é o que mais falo... 
A primeira dificuldade é a da escrita. Escrever para alguém e ninguém ao mesmo tempo é uma coisa complicada, mas o primeiro passo é querer. Na verdade eu já tô querendo escrever há um bom tempo, mas o começar é sempre pior, não é que eu não tenha o que falar ou que não saiba o que escrever, é o não saber como. A gente sempre quer muitas coisas e têm muitas coisas... Conciliar essas coisas é uma tarefa árdua. Eis que surge a segunda dificuldade: organização. Organização pressupõe um planejamento e planejamento pressupõe tempo, tudo coisa difícil! Agora vem a segunda parte, em que eu me explico... Falar de dificuldades não significa fazer reclamações. Pelo contrário, falar de dificuldades, pra mim, significa falar de méritos, de desafios já vencidos ou que serão vencidos. 
Costumo ter umas neuras quando penso no que eu posso (ou quero) falar, hoje, por exemplo, eu queria falar tanta coisa, mas não pretendo falar nem um terço, mas continuando com o papo dos desafios vencidos... vou falar, então, de mais uma etapa vencida na minha vida... a Graduação! 
Minhas primeiras escrituras daqui (no blog) foram em um contexto em que eu pensava até em trancar a faculdade, li coisas que me desanimavam (sim, sobre a doença de cushing), mas como eu disse, pra mim, falar de dificuldades não significa fazer reclamações (não que eu não faça reclamações, lógico, sou expert nisso) e eu resolvi que eu não absorveria as palavras de tantas coisas que eu li, pessoas que se enclausuraram ou que faziam do problema um drama maior do que realmente é, ou até é um problema gigante mesmo, mas que se deixavam abater e passavam isso pra todos... Não é isso que eu quero. Só de falar disso já me sinto um pouco ridícula porque parece que é meio paradoxal... enfim... Venci essa etapa! Amanhã (no caso, hoje, porque já passa da meia noite) é minha formatura, e de quebra passei no mestrado e na outra semana já começam minhas aulas. Não, eu não consigo ficar parada. E acho que são essas coisas que dão forças, é ter objetivos, é ter pessoas que apoiam teus objetivos... 
Nesse meio tempo de final de graduação, final de estágio, prova de mestrado, preparativos pra formatura,  diretamente proporcional a isso tudo aconteceu aumento da minha pressão, aumento de irritabilidade, dores de cabeça com maior frequência e toda aquela confusão psicológica normal intrínseca à Rafaella... 
O que eu me peguei pensando nesses últimos dias foi "será que eu vou ser ansiosa desse jeito pro resto da vida ou isso  é mais algum sintoma?" aí me veio na cabeça a pergunta de uma campanha publicitária de carros "o que te move?" Acho que o que me move é todo dia acordar e pensar que alguma coisa vai acontecer, não importa o que, alguma coisa SEMPRE vai acontecer... Agora estar satisfeito com as coisas que acontecem depende de planejar essas coisas e estar preparado pra que eventualmente elas deem errado. Não digo que eu esteja preparada pra essas coisas, mas só a consciência disso já me acalma, pelo menos um pouco... Na realidade, às vezes eu acho que eu planejo até demais e lógico que os detalhes nunca saem como a gente quer, mas às vezes essas surpresas são as melhores coisas... 
Quando fiz a prova do mestrado, por exemplo, eu estava apavorada e ao mesmo tempo estava tranquila porque eu pensei "bom, tô me formando agora, eu sei que eu não tenho experiência nenhuma, posso tentar no final do ano de novo". Acho que isso foi o que me ajudou, e eu passei. A pressão de todo mundo dizendo "ah, nem te preocupa que tu passa, super tranquilo, nem tenho dúvidas" era uma coisa alucinante, era um martírio absurdo porque por mais que as pessoas queiram te incentivar a única coisa que te vem à mente é "meudeus, tão dizendo que é fácil, e se eu não passar? vou me sentir a mais imbecil do mundo!" Passei, estou feliz e mais feliz ainda por saber que foi por conhecimentos que eu realmente tenho, por saber que eu tenho capacidade. 
Outra felicidade  no meio das dificuldades foi compartilhar essa felicidade. O estágio de docência é um período tenso, me aguentar com cushing, TPM e todos os hormônios à flor da pele não é tarefa fácil. Em contrapartida eu tive acompanhamento, como sempre. Tive acompanhamento da minha Família, dentro desse "termo" eu incluo todos, todos que me querem bem. Não sei o que seria de mim sem a minha família de parentes, família de amigos, família de profissionais... Tive momentos de alegria tão grande, que ver escrito um nome de um membro dessa família no mural da pós-graduação me fez chorar tanto que eu nem sabia o que fazia. Tive momentos de insanidade tão grande que cheguei a marcar fisicamente um outro membro da família. Tive momentos de apoio à distância. Tive momentos em que coloquei na cabeça certas coisas e mesmo sendo avisada acreditava no contrário, aí depois de um detalhe vi que o aviso era procedente. Tive momentos em que machuquei e mesmo assim fui apoiada.
Não tenho vergonha de dizer que eu não consigo fazer nada sozinha. Acho que o que me move é saber que tem muita gente ao meu redor e essa gente não me é indiferente. 
Sei que todos tem dificuldades, não desmereço as dificuldades dos outros, mas só consigo sentir as minhas. Sei que cada um só consegue saber das suas dificuldades, ninguém faz uma transmutação e consegue saber exatamente o que os outros sentem...
Hoje (ou ontem, whatever), por exemplo, fiquei sabendo de mais um procedimento (da novela da batalha contra o cushing) que terei que passar, com porcentagens não tão agradáveis de sucesso e com detalhes de filme de terror. 
Bom, relatando essa parte... Cheguei na clínica para consulta com um neurocirurgião, já sabendo que eu teria que fazer uma radiocirurgia (porque só a medicação não está dando conta e etc), eis que estou esperando para ser chamada e entra um homem com uma espécie de capacete que parece um tipo de aparelho ortodôntico que cobre a cabeça inteira, preso por parafusos na testa e na nuca, a única imagem que me vêm é a do Hellraiser! Fiquei apavorada, ele senta numa cadeira do meu lado e eu só pensando "e se alguém esbarra? que agonia!" Entrei no consultório, médico se apresenta eu conto minha história, aquela ladainha toda e ele começa a narrar o procedimento... "aí tu vem mais cedo pra colocar o arco na cabeça..." e eu "ah! é? igual do homem ali de fora?" e ele "ah! isso! uma imagem vale mais que mil palavras. então, sabe aquela expressão 'de graça até injeção na testa'? quem passa por esse procedimento sai dizendo 'injeção na testa nunca mais, nem que me pague!" 
E esse comentário da injeção na testa foi falando só sobre a anestesia...anestesia pra colocar os tais parafusos na minha cabeça pra colocar o tal arco estereotaxico... E o detalhe mais legal: todo o procedimendo eu tenho que estar acordada e alerta. Eu tinha reclamado que não queria fazer outro cateterismo e etc, etc, etc... mudou o lugar agora, novos desafios! 
Já nem lembro exatamente como cheguei nesse assunto, mas enfim, a parte das dificuldades... impossível medir níveis de dificuldade. Não sei até que ponto coisas que eu passei podem ser consideradas muito difíceis, mas na época pareceram... é que nem a gente lembrando de uma prova de recuperação de matemática na quinta série do ensino fundamental... na época era a coisa mais temida do mundo, mas depois que passou tanto tempo a gente pensa "mas era tão simples...".
Tive incalculáveis dificuldades esse semestre, mas agora que passou eu penso "acho que tirei de LETRA". Sei que ainda terei outras infinidades de dificuldades, mas, como eu disse, é isso que me move...

sábado, 9 de abril de 2011

eu(s)

Costumo escrever aqui coisas que saem da minha cabeça, mas na realidade é impossível dizer que alguma coisa sai apenas da nossa cabeça, nós somos feitos de infinitos "eu(s)"...
Ultimamente estou mais leitora do que escrevedora... mas como diria Barthes, nós costumamos ter o "desejo da escritura" se nos relacionamos positivamente com determinada leitura...
Estava eu lendo um livro da Marina Colasanti e me peguei chorando de tão lindo que é "Uma ideia toda azul" e eu poderia até explicar todas as relações que eu fiz com os contos do livro, mas aí as outras pessoas se prenderiam a alguma coisa que talvez não fosse o que "eu quis dizer", então eu resolvi escrever o conto aqui, exatamente como está no livro, mas transformando em meu. Afinal, como diria Jorge Luis Borges, em "Pierre Menard, o autor do Quixote", pode parecer que é uma simples cópia, mas não é...
enfim...

A Primeira Só

Era linda, era filha, era única. Filha de rei. Mas de que adiantava ser princesa se não tinha com quem brincar?
Sozinha, no palácio, chorava e chorava. Não queria saber de bonecas, não queria saber de brinquedos. Queria uma amiga para gostar.
De noite o rei ouvia os soluços da filha. De que adiantava a coroa se a filha da gente chora à noite? Decidiu acabar com tanta tristeza. Chamou o vidraceiro, chamou o moldureiro. E em segredo mandou fazer o maior espelho do reino. E em silêncio mandou colocar o espelho ao pé da cama da filha que dormia.
Quando a princesa acordou, já não estava sozinha. Uma menina linda e única olhava para ela, os cabelos ainda desfeitos do sono. Rápido saltaram as duas da cama. Rápido chegaram perto e ficaram se encontrando. Uma sorriu e deu bom dia. A outra deu bom dia sorrindo.
- Engraçado – pensou uma - , a outra é canhota.
E riram as duas.
Riram muito depois. Felizes juntas, felizes iguais. A brincadeira de uma era a graça da outra. O salto de uma era o pulo da outra. E quando uma estava cansada, a outra dormia.
O rei, encantado com tanta alegria, mandou fazer brinquedos novos, que entregou à filha numa cesta. Bichos, bonecas, casinhas e uma bola de ouro. A bola no fundo da cesta. Porém tão brilhante, que foi o primeiro presente que escolheram.
Rolaram com ela no tapete, lançaram na cama atiraram para o alto. Mas quando a princesa resolveu jogá-la nas mãos da amiga, a bola estilhaçou jogo e amizade.
Uma moldura vazia, cacos de espelho no chão.
A tristeza pesou nos olhos da única filha do rei. Abaixou a cabeça para chorar. A lágrima inchou, já ia cair, quando a princesa viu o rosto que tanto amava. Não um só rosto de amiga, mas tantos rostos de tantas amigas. Não na lágrima que logo caiu mas nos cacos que cobriam o chão.
- Engraçado são canhotas – pensou.
E riram.
Riram por algum tempo depois. Era diferente brincar com tantas amigas. Agora podia escolher. Um dia escolheu uma e logo se cansou. No dia seguinte preferiu outra, e esqueceu-se dela logo em seguida. Depois outra e outra, até achar que todas eram poucas. Então pegou uma, jogou contra a parede e fez duas. Cansou das duas, pisou com o sapato e fez quatro. Não achou mais graça nas quatro, quebrou com o martelo e fez oito. Irritou-se com as oito partiu com uma pedra e fez doze.
Mas duas eram menores do que uma, quatro menores do que duas, oito menores do que quatro, doze menores do que oito.
Menores cada vez menores.
Tão menores que não cabiam em si, pedaços de amigas com as quais não se podia brincar. Um olho, um sorriso, um pedaço de si. Depois, nem isso, pó brilhante de amigas espalhado pelo chão.
Sozinha outra vez a filha do rei.
Chorava Nem sei.
Não queria saber das bonecas, não queria saber dos brinquedos.
Saiu do palácio e foi correr no jardim para cansar a tristeza.
Correu, correu, e a tristeza continuava com ela. Correu pelo bosque, correu pelo prado. Parou à beira do lago.
No reflexo da água a amiga esperava por ela.
Mas a princesa não queria mais uma única amiga, queria tantas, queria todas, aquelas que tinha tido e as novas que encontraria. Soprou na água. A amiga encrespou-se, mas continuou sendo uma.
Então a linda filha do rei atirou-se na água de braços abertos, estilhaçando o espelho em tantos cacos, tantas amigas que foram afundando com ela, sumindo nas pequenas ondas com que o lago arrumava sua superfície.

sábado, 19 de março de 2011

e agora?

E agora e depois e ainda há pouco e o tempo todo...
O tempo todo acontecem coisas com a gente, que supostamente são desconexas, mas o que as conecta é o fato de pensarmos nessas coisas... sim, nós somos o centro do nosso universo. Acho que eu já comentei isso algum dia, não é egocentrismo, é só ponto de vista... Mas acho que em um determinado momento esse meu ponto de vista se perdeu pelo caminho... Na vontade de ter "tudo" organizado, de querer tudo controlado, o foco se perde e ao invés de controlar a nossa própria vida a gente quer controlar outras coisas que estão fora de nosso alcance. O primeiro passo para mudanças é "querer", mas o segundo passo é "fazer" e não "continuar querendo", ou, esperar que "outros colaborem". Talvez muitas pessoas tenham repetido isso pra mim infinitas vezes, mas eu precisava ouvir não apenas com os ouvidos, talvez a melhor forma de entender certas coisas seja lembrando das palavras em um momento apropriado. E não, nunca é tarde para mudanças (mudanças positivas, sejamos otimistas!).
Eu sou supersticiosa e geralmente prefiro falar das coisas depois que elas aconteceram, mas aconteceu tanta coisa neste ínterim que agora me questiono o que é digno de ser narrado e o que não é.
Repito várias vezes que detesto psicologia de auto-ajuda e que desprezo livros do gênero e etc, mas passei por um tratamento "de introspecção" que valeu a pena... É bom se colocar em primeiro lugar, às vezes. Difícil é continuar fazendo isso, mas é possível.
Eu queria viver minha vida normalmente como se não tivesse ficado doente, porque vi depoimentos de pessoas que deixaram se dominar pela doença e viviam em função disso. Eu não queria parar de fazer nada do que eu gosto e fazia, mas eu me lembrei que eu já parei de fazer algumas coisas e que minha vida mudou e eu tenho que me adaptar... Me disseram que eu não tenho que fingir que a doença não existe, eu tenho que aceitar que estive doente porque as coisas só podem ir embora depois que elas chegam. Depois que comecei a tomar o remédio, meu cortisol estava controlado e num belo dia descontrolou-se e subiu absurdamente... O que isso significa? Sei lá!
Em parte eu acho que deixei "por conta" do medicamento e esqueci que o cushing existia. Mas a verdade é que remédios não fazem milagres, eu que preciso fazer mudanças. Mas essas mudanças não devem acontecer pra estar dentro das expectativas de outras pessoas, devem acontecer só pra mim e o resto é consequência...
Me dei o direito de ficar cinco dias "offline" (parece pouco, mas isso é uma grande batalha pra alguém que fica o dia inteiro, todos os dias, conectada à internet) O que eu descobri? Descobri que massagem nos pés é ótimo pra pensar (!!!) e que nós podemos aproveitar melhor o nosso tempo, se realmente quisermos...
Algumas vezes me senti como a Alice, com o pedacinho de bolo que dizia "coma-me" que fazia ela crescer e o líquido com o frasco que dizia "beba-me" que fazia ela diminuir, e me afoguei nas minhas próprias lágrimas pensando que "eu deveria seguir meus conselhos".
Não tenho todas as respostas pras minhas dúvidas (e se eu tivesse é lógico que eu não postaria abertamente num veículo da internet) mas a gente precisa externalizar de vez enquando... De novo presenciei a necessidade das pessoas de falar, ou de expressar seus sentimentos até mesmo no silêncio. Essa semana de tratamento complementar foi diferente de quando fiquei em SP, em tese, acredito que era pra ter sido mais fácil, mas foi um bom fight... Quando a gente tem que lutar contra e a favor de nós mesmos - ao mesmo tempo - o caso complica, mas a boa notícia é que a gente sempre vai sair ganhando.

e agora, um novo começo... (que assim seja!)